Ou… Tudo que você queria saber sobre engajamento e não tinha para quem perguntar!
Alguns avisos gerais antes de você entrar de vez na leitura.
Estamos nos referindo aqui a pessoas. Não estamos falando daquele povo que aparece feliz e saltitante nas imagens de equipes em blogs, estamos falando de gente real, que às vezes levanta de mau-humor e mesmo assim vai para a empresa e entrega além do que foi contratado. Aquela imagem idílica é uma farsa que nos acostumaram a idealizar através de bancos de imagens e textos ocos das redes sociais.
Também não estamos escrevendo sobre “millennials”, “Geração Y” ou coisas do tipo. Veja este artigo onde falamos um pouco disso. Estamos falando de gente. Ponto. Gente que largaria o trabalho se ganhasse na Mega-Sena, provando que todo aquele “significado” que tentam dar para o trabalho pode ir embora por conta do dinheiro ou de outros sonhos. Veja aqui um outro artigo sobre isso.
Existem hoje na internet mais de 250 softwares ou aplicativos de engajamento, pesquisas pulso, gestão de onboarding, de colaboração ou mensagens no local de trabalho. Se está assim, ouso dizer que é por conta de estarmos perdendo nossa capacidade de nos relacionar de maneira minimamente saudável com nossos colegas de empresa. Faz muito tempo que o trabalho perdeu o significado para as pessoas e por mais que as empresas e alguns “gurus” tentem falar que estamos na era do propósito, o que eles estão fazendo é tentar ligar algum propósito à vida de pessoas que não os tem, ou têm o do dia, o da moda, o do momento. E isso não traz engajamento de longo prazo e muito menos os benefícios do engajamento. Falar de propósito nas empresas é tema de uma outra conversa que teremos outro dia.
E sendo nosso assunto o engajamento, coletei algumas perguntas sobre o tema e vamos tentar responde-las neste texto.
Por que engajamento e o que é isso?
Uma analogia de início: em inglês o termo é engagement, o mesmo usado para designar o noivado, aquela etapa do relacionamento que vem depois do crush, do ficar, do namorar e antes do casar. É quando se está decidido e disposto a construir algo grande juntos! O que acontece (deveria acontecer) ali é um compromisso emocional forte e real entre duas pessoas e daí vem uma primeira consequência: para o engajamento existir é necessários o esforço dos dois lados.
Então podemos definir engajamento aqui em nosso contexto como:
“A conexão emocional com uma organização que faz o colaborador ser naturalmente produtivo e contributivo, pensando em construir seu futuro ali e tendendo a não mudar de empresa mesmo tendo oportunidades”.
Então perceba que o engajado é alguém que luta e se esforça para que as coisas deem certo.
O que não é engajamento?
Algumas confusões são feitas quanto estas outras dimensões de um relacionamento entram na equação, então, de uma maneira prática:
Satisfação.
É o sentimento de ter suas expectativas atendidas ou superadas. É o que, em última análise, se mede em uma pesquisa de clima organizacional, a satisfação do colaborador com os diversos processos em que está imerso. Ela é fundamental para reter pessoas, mas nem sempre suficiente para garantir a produtividade, sendo mais um componente na construção do engajamento.
Bem-estar.
Na verdade bem-estar nem deveria estar aqui, mas como já vi empresas usando a expressão “pesquisa de bem-estar” para se referir a uma pesquisa de engajamento e clima, sou obrigado a colocar aqui. É a sensação de segurança, conforto, tranquilidade. Algo mais espiritual até. Quando olhamos para o ambiente de uma empresa, onde falamos o tempo todo de tirar as pessoas da zona de conforto e desafia-las vemos porque não faz sentido esta expressão.
Felicidade
Aqui é mais fácil. É a satisfação plena, mais o bem-estar e muito obviamente está ligada ao TODO da vida e não a alguma área da vida. Ser “feliz” no trabalho está mais ligado a ter amigos e colegas com o quais se relaciona bem, dá risadas e pode falar o que sente e não necessariamente trabalhar duro, entregar mais e ser produtivo.
Pesquisa de clima é pesquisa de engajamento? E o inverso?
A pesquisa de CLIMA mede a percepção da satisfação do empregado quanto aos diversos processos do dia a dia da empresa. É a sua satisfação com os processos relevantes para ele.
Já a pesquisa de ENGAJAMENTO mede o vínculo formado entre empregado e empresa, que o faz ser naturalmente produtivo e contributivo, não mudando de empresa mesmo tendo oportunidades.
O que cria engajamento em uma empresa de teleatendimento é o mesmo processo que cria engajamento num instituto de pesquisas em telecomunicações? É o mesmo numa empresa de consultoria cheia de profissionais juniores e numa outra cheia de consultores seniores? A resposta óbvia e comprovada pelas nossas pesquisas é: NÃO!
Como consequência disso, para você fazer um pesquisa de ENGAJAMENTO de verdade, você precisa ter os dois lados da equação: as questões de CLIMA, aquelas que medem a satisfação com os processos e as questões de ENGAJAMENTO, as que evidenciam conexão, pois só assim você pode identificar através de análises estatísticas, quais os aspectos mais impactantes na formação de vínculos para a SUA EMPRESA, pois você não gerencia o engajamento de maneira direta, só indireta.
O nome correto para este tipo de pesquisa é: Pesquisa de Engajamento e Clima Organizacional. Com ela você tem as duas medidas: Clima (pois satisfação com os processos está relacionada com aumento de produtividade e lucratividade) e Engajamento (pois aumento do vínculo torna as pessoas menos críticas aos erros da empresa e mais propensas a permanecer contribuindo e remando junto).
Concluindo: você não deve pensar em Engajamento ou Clima, mas sim em Engajamento “E” Clima.
O que o engajamento provoca?
Não se faz gestão de engajamento à toa, só para sair bem na foto, pois seus impactos no negócio vão muito além de manter a boa imagem da empresa nas redes sociais.
A gestão de engajamento:
Aumenta a produtividade,
Diminui o absenteísmo,
Melhora a satisfação do cliente final,
Aumenta a segurança do trabalho,
Diminui o turnover,
Aumenta a reputação da empresa no mercado,
Atrai os melhores talentos,
Aumenta a lucratividade,
Aumenta o valor de mercado da empresa.
Como se mede o engajamento?
Aqui acontece grande parte da confusão neste tema, pois se não se sabe o que se vai pesquisar, não se sabe como medir e muito menos o que significa o que se pesquisou.
Já falamos aqui que o engajamento é algo percebido, sentido e vivido pelo indivíduo e, portanto, não dá para ser medido diretamente, mas podemos medir seus “sintomas” e efeitos. Existem diversas maneiras de fazer isso, mas aqui vou abordar a metodologia que desenvolvemos e adotamos na Carvalho e Mello. Utilizando nossa base de dados com mais de 2 milhões de respondentes e mais de 100 milhões de observações de clima, engajamento e desempenho, identificamos correlações entre as diversas variáveis e criamos um questionário com dois grupos de questões:
(Questões de engajamento) um conjunto de variáveis dependentes que vão identificar os sintomas e os efeitos do engajamento. (que não podem ser gerenciadas diretamente, como o orgulho por exemplo. Você não consegue criar em uma pessoa o orgulho de pertencer a uma empresa, algumas coisas têm de acontecer para que o orgulho comece a ser sentido e vivenciado)
(Questões de clima ou de processos) um conjunto de variáveis independentes (que podem ser gerenciadas diretamente. A disponibilidade de atividades de desenvolvimento profissional por exemplo, pode ser avaliada diretamente pelo colaborador e gerenciada diretamente pela empresa e tem impacto direto na formação de vínculos e consequentemente de engajamento)
Onde o engajamento acontece?
O ninho do engajamento é a área, o setor, a equipe do colaborador e a mãe é a imagem, a reputação da empresa. Existe um equilíbrio de forças concorrentes para sua formação, mas inegavelmente o engajamento não se sustenta no tempo só com um desses vetores. Gestores e colegas tóxicos desengajam na mesma proporção que escândalos e abalos na imagem interna e externa da empresa.
O que cria o engajamento?
Viramos do avesso aquele enorme banco de dados que mencionei acima, fizemos análises, regressões, correlações e agrupamos os aspectos que mais são responsáveis pela criação do engajamento e chegamos a quatro dimensões principais:
AUTONOMIA
Liberdade para contribuir, flexibilidade fazer o que tem de ser feito de um jeito mais pessoal, possibilidade de fazer escolhas, decidir a respeito de como o trabalho deve ser feito, ser envolvido e ter a opinião tida como válida nas decisões.
DESENVOLVIMENTO
Oportunidade de novos trabalho e desafios, oportunidade de crescimento profissional e pessoal, perceber que ao final do ano de trabalho ele é uma pessoa mais qualificada, com maior empregabilidade.
SIGNIFICADO
Perceber que o que faz na empresa tem a ver com o que pensa a respeito da vida. A missão da empresa realmente está relacionada com seus valores. O que ele faz lá realmente é útil, não só para a empresa mas para a comunidade em que ela está inserida.
PERTENCIMENTO
Sentir que pertence àquele lugar pelos relacionamentos formados com as pessoas de sua equipe incluindo seu líder imediato, bem como um vínculo intangível criado com a imagem corporativa, com a marca e o que ela representa para ele, sua família e a sociedade em que ele vive.
Como gerenciar o engajamento?
Vamos lembrar a resposta lá na questão “Onde o engajamento acontece”. São duas grandes forças ambientes trabalhando: a área, fortemente impactada pelas atitudes e posturas do gestor e a imagem da empresa, muito impactada pela sua reputação no mercado e atitudes do grupo executivo. Sendo assim, o gerenciamento sempre terá que contar com ações locais e organizacionais ao mesmo tempo. Fazer só uma parte do trabalho é contar com a sorte.
A principal atividade de gestão de engajamento é criar a cultura do engajamento sobre a qual falaremos adiante.
É possível criar uma cultura de engajamento?
Sim, claro! Criar cultura é 50% propósito, 50% processo. A cultura pode ser definida como o conjunto de crenças que são evidenciadas pelos ritos, hábitos, valores e atitudes compartilhados pelas pessoas de uma empresa. De baixo para cima, se as pessoas estão compartilhando atitudes, valores e hábitos que engajam, aí se está criando uma cultura de engajamento. De cima para baixo, precisa existir uma vontade beirando o propósito, que cobrará dos gestores e dos processos coerência no engajamento. A criação dessa cultura passa então pela vontade e pelos processos.
Que processos podem ser criados para reforçar a cultura do engajamento?
Quando você repete algo com a mesma intensidade e frequência, você está criando um padrão, está criando consistência e isso é a semente da cultura. Construir um “manual do gestor de equipes” indicando claramente como ele deve agir nas situações padrão, não só vai nivelar a resposta dos gestores, como também criar um padrão de resposta a ser seguido naquelas situações que não foram ali apontadas.
Então, antes de levar alguém à condição de gestor de equipes, entregue para ele um manual e treine-o em como construir confiança, como recrutar bem, como conduzir uma reunião, como reconhecer um bom trabalho, como envolver a equipe em um projeto, com planejar as atividades do dia a dia, como integrar novos membros à equipe, como dar feedback, como reconhecer e elogiar um bom trabalho, como lidar com colaboradores refratários e um monte de outras situações. Dê o padrão de o QUÊ ele deve fazer e COMO ele deve fazer. Isso vai fazer com que ele crie uma agenda positiva de engajamento.
Como fazer com que os gestores tenham o engajamento na sua agenda?
Para responder a esta questão, vamos aqui separar os gestores em 3 tipos.
Os Engajadores. São aqueles que possuem naturalmente o dom (não gosto muito dessa palavra, mas vou utiliza-la) de fazer sua equipe se conectar à empresa, contribuir mais, dando-lhes autonomia, o senso de pertencer a algo maior, dando oportunidade de desenvolvimento e dando um sentido ao trabalho que a equipe realiza. Pelas nossas pesquisas, esse grupo não passa de 10% dos gestores nas boas empresas.
Um outro grupo podemos chamar de Replicador ou “Fala-como-é-para-fazer-que-eu-faço”. Eles não têm o “dom natural” para a coisa, mas estão abertos e têm bagagem para serem treinados e repetirem ações e processos que incrementam o engajamento. Aqui temos aproximadamente 70% dos líderes nas boas empresas, aquelas que conseguem atrair os melhores e têm sistemas de recrutamento mais maduros.
E tem o líder Desengajador. É aquele que mesmo seguindo uma cartilha explicando o que fazer, consegue colocar tudo a perder nas pequenas coisas do dia a dia, pois o que importa no final é o COMO as coisas são feitas. Eles não conseguem manter uma relação de confiança com a equipe, seja por um gap na abertura, na percepção de injustiça, na quebra de promessas e outras posturas pouco louváveis. Aí vemos que um veneno para o engajamento é falta de confiança. Seja no gestor, nos colegas ou no futuro da empresa, pois engajamento é visão de futuro, confiança no futuro.
Essa história do COMO as coisas são feitas pode ser exemplificada numa ação de engajamento corriqueira, como um cartão de aniversário de tempo de empresa. O gestor pode seguir o indicado no manual e colocar um bilhete na mesa do colaborador onde está escrito:
“Parabéns pelos 10 anos de empresa. Espero de que venham outros dez! Um abraço. Fulano”
Ou pode escrever:
“Hoje faz dez anos que trabalhamos juntos. Você me ensinou a respeitar as opiniões diferentes da minha, a apoiar projetos por conta da confiança que depositava nas pessoas que os conduziam, comemoramos muitos sucessos e rimos de alguns fracassos e agradeço por você ter feito não só a mim, mas à maioria de seus colegas, profissionais melhores. Obrigado! Fulano.
Creio que não preciso explicar a diferença de resultado entre eles. Foco no COMO fazer. Seja claro, não tenha medo de explicar tudo, pois existe uma clara tendência das pessoas de superestimarem a visibilidade de suas emoções e é comum gestores assumirem que sua equipe percebe como se sente a respeito deles. Este exemplo foi tirado de um ótimo pequeno artigo a HBR.
Para os gestores dos dois primeiros grupos (Engajador e Replicador), criar um repertório de ações de engajamento é um ótimo caminho, comprovadamente eficaz e fundamental para a percolação da cultura pela estrutura da empresa. Já para o terceiro grupo, são necessárias ações de desenvolvimento e intervenção do RH e da liderança acima ou o desligamento, pois um gestor com esse perfil tem um potencial tremendo de estrago.
Veja o exemplo de um calendário do engajamento que pode ser seguido por qualquer gestor neste link.
E se fosse fazer um resumo de uma cultura de engajamento, qual seria?
Resumos são cruéis, pois normalmente mostram muito, mas escondem o essencial. Então falo do essencial agora: Genuíno interesse e Confiança.
Mas vamos ao resumo:
1) Recrute bem. Escolha as pessoas que tem a ver com a cultura da empresa, pessoas que se sintam bem tendo que tomar decisões, não chiem se ficarem desconfortáveis e que gostem de desafios. (Ok, sei que não existem muitos por aí, mas procure!) Recrute gestores que sabem lidar com gente e engajar pessoas.
2) Faça da integração ou onboarding uma experiência memorável. Planeje seis meses de atividades que trarão uma experiência cativante para o colaborador, e você não precisa de softwares para isso. Precisa de cultura!.
3) Exercite o feedback sempre. É papel do gestor e dos membros da equipe também. Crie a cultura do feedback que é uma sub-cultura do engajamento. Veja uma ideia de como fazer isso AQUI.
4) Delegue. A autonomia só vai existir se o gestor delegar e isso pode ser feito com processo e um pouquinho de boa vontade. .
5) Acelere. Exigir um pouco mais do que foi entregue antes é condição para a existência de desafios que abrem a cabeça e os corações para as conquistas.
6) Reconheça. Se você exige mais, você tem que reconhecer mais, nas diversas nuances do reconhecimento, que tem sempre que ser oportuno, relevante e sincero:
A Valorização (da pessoa);
O Reconhecimento (da circunstância);
O Agradecimento (pelo esforço);
A Recompensa (pelo resultado);
O Prêmio (pelo destaque).
Isso é treino e processo, logo, dá para ser implementado sem muitas dores. A cultura do reconhecimento também é uma sub-cultura do engajamento.
7) Crie o manual do gestor. Fundamental para espalhar e replicar a semente da cultura de engajamento.
8) Pesquise e faça medições na frequência adequada. Não pesquise demais pois gente é gente, logo se aborrece e se chateia com facilidade se você fica lhe perguntando toda hora: como está seu engajamento?Você gosta de mim? Está tudo bem? Estou me comunicando direito? Isso é um porre e só traz excesso de trabalho para os gestores, baixa taxa de respostas por fadiga de pesquisa e a realidade pautada pelos insatisfeitos, pois só eles se prestam a responder pesquisa toda semana. Não fique pesquisando semanalmente! Uma pesquisa âncora por ano e mais uma pesquisa termômetro, intervalada no semestre é suficiente. Você faz exame de sangue toda semana só se estiver com alguma doença crônica e grave. Caso contrário o exame periódico anual está ótimo!
Tem mais perguntas? Manda pra gente que vamos tentar responder!!
Um grande abraço!